AUMENTO DA CRIMINALIDADE
INFANTO JUVENIL NO PAÍS, REACENDE O DEBATE SOBRE A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
Em meio ao contínuo envolvimento de menores em crimes no Rio
de Janeiro, como arrastões e roubos, ainda não há consenso sobre a redução da
maioridade penal, polêmica que já suscitou dezenas de projetos de lei no
Congresso e que segue dividindo opiniões no país.
O problema foi tema de debate da última disputa
presidencial, e o assunto dividiu os
candidatos da oposição, Aécio Neves (PSDB), que se colocou a favor de alterar a
idade criminal, e a candidata reeleita, Dilma Rousseff (PT), contrária à
medida.
O tema é recorrente e volta à mídia cada vez que um crime
cometido por adolescente ganha destaque ou quando ocorrem ondas de
criminalidade como a dos arrastões nas praias cariocas e as polêmicas medidas
da polícia, que intercepta ônibus com jovens provenientes das periferias com
destino à orla nos fins de semana.
Dados nacionais mostram uma elevação no índice de jovens
internados por cometerem crimes. Levantamento da Secretaria de Direitos
Humanos, ligada à Presidência da República, aponta que o número de adolescentes
que cumprem medidas socioeducativas com restrição de liberdade subiu de 16.868,
em 2008, para 20.532, em 2012.
Juristas e advogados ligados aos direitos das crianças e
adolescentes têm, ao longo dos últimos anos, se mostrado contra alterações no
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), aprovado em 1990, que ratificou a
maioridade penal de 18 anos estabelecida desde o Código Penal de 1940.
Por outro lado, outras correntes de juristas defendem que
adolescentes menores de 18 anos deveriam sofrer punições maiores do que a atual
pena máxima de três anos de internação em instituições de ressocialização.
O apoio à redução da idade criminal encontra ressonância
entre autoridades de segurança pública, muitas das quais têm se mostrado a
favor da medida como forma de lidar com a criminalidade.
Recentemente, o secretário de segurança do Estado do Rio de
Janeiro, José Mariano Beltrame, disse que "a idade e o período de detenção
deveriam depender da gravidade do crime que o menor cometeu". "(O
jovem) precisa sofrer as agruras da lei em cima do que fez", afirmou.
Em São Paulo, o novo delegado-geral da Polícia Civil,
Youssef Abou Chanin, foi mais longe ao defender a medida quando assumiu o
cargo, em janeiro deste ano. "Os menores hoje são 007, têm licença para
matar. Por quê? Porque vão para a Fundação Casa, ficam preso um período e
saem", disse.
Contrário à alteração na lei, o advogado Ariel de Castro
Alves, especialista em Políticas de Segurança Pública pela PUC-SP,
ex-conselheiro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
(Conanda) e fundador de órgão semelhante na OAB nacional, diz que reduzir a
maioridade penal é uma "ilusão".
"Na prática essa alteração só formaria criminosos de
forma cada vez mais precoce, dentro das cadeias. O crime só inclui quando o
Estado exclui, quando o jovem procura escola, trabalho, estágio, e não
consegue", diz.
Escola integral
Consultados pela BBC Brasil, juristas que participaram de
debates sobre a reforma do Código Penal, em 2012, analisaram o tema da
criminalidade de menores e apresentaram argumentos contra e a favor da redução
da maioridade penal.
Em São Paulo, os menores de 18 anos que cometem crimes vão
para a Fundação Casa Luiz Flávio Gomes, mestre em direito penal pela USP e
ex-consultor da ONU, diz que há uma série de mitos em torno da concepção de que
no Brasil o menor não é punido.
O jurista, que se diz contrário à redução da maioridade,
relembra que o ECA prevê punições e medidas socioeducativas, com ou sem
restrição da liberdade, para crianças a partir de 12 anos.
Ele admite, no entanto, que a pena máxima de três anos
poderia ser revista, e elevada para até oito anos. "Como o ECA coloca três
anos para tudo, acaba gerando uma injustiça. Eu não posso equiparar um roubo a
um homicídio."
Gomes diz acreditar no ajuste da pena máxima e investimentos
em educação como as melhores opções.
"Além da reforma do ECA e da adoção da escola integral
em todo o país, não vejo outras soluções. Argumentar a favor da redução da
maioridade, jogando adolescentes no sistema prisional já falido, é parte de
estratégias eleitoreiras e ideológicas, que se valem do medo e do pânico da população",
disse.
Punição e
flexibilidade
Do outro lado do debate, o desembargador José Muiños Piñeiro
Filho, da 2ª Câmara Criminal do TRRJ, defende a redução da maioridade penal
para 16 anos.
"É algo que tem
ser discutido, sim. Num momento em que muitos jovens estão cometendo crimes
violentos, tráfico, roubos, latrocínios, este debate se faz pertinente. E não
se pode esquecer que há muitos detalhes a serem decididos", disse.
Piñeiro Filho sugere, por exemplo, que, no caso da redução
da maioridade penal para 16 anos, os condenados menores de 21 anos cumpram pena
em presídios separados dos maiores de 21 anos.
Ao avaliar o momento atual, o jurista Ariel de Castro Alves
diz que existe um clamor nacional em torno do assunto, e que a tendência é que
o debate só aumente. Ele acredita, no entanto, que apesar dos problemas no
sistema atual, as instituições ainda funcionam melhor do que os presídios, e
que a maioridade penal deve ser mantida em 18 anos.
"Antes de tentar mudar o ECA ou suprimir direitos, é
necessário garanti-los. É necessário reconhecer que o Brasil precisa ter
políticas sociais, políticas afirmativas, bolsas de estudo, e que é preciso
oferecer possibilidades para que os jovens não sejam alvo fácil do mundo do
crime", disse.
Jefferson Puff
Da BBC Brasil no Rio
de Janeiro
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