Por que os bancos brasileiros lucram
tanto?
Segundo um levantamento feito pela consultoria Econométrica
para a BBC Brasil, apesar da desaceleração econômica, a rentabilidade sobre
patrimônio dos grandes bancos de capital aberto no Brasil foi de 18,23% em 2014
– mais que o dobro da rentabilidade dos bancos americanos (7,68%).
oram considerados no levantamento os bancos com ativos
acima de US$ 100 bilhões. Apenas o Banco do Brasil teve queda de rentabilidade
em 2014 na comparação com 2013 (de 24% para 16,6%). O Itaú teve alta de 20%
para 22,6%. O Bradesco, de 17% para 19,8%. E o Santander passou de 3,61% para
3,9%.
Itaú teve ainda um aumento de seu lucro de 30,2% em 2014 –
registrando o maior lucro da história dos bancos brasileiros de capital aberto
segundo a Economatica (R$ 20,6 bilhões).
O lucro do Bradesco também se expandiu bastante – 25,6%. E
isso em um momento em que consultorias econômicas estimam um crescimento
próximo de zero para o PIB de 2014.
Diante desses números, não é de se estranhar que dos 54
bilionários brasileiros citados no último levantamento da revista Forbes, 13
estejam ligados ao setor bancário.
Mas afinal, o que faz os bancos terem resultados financeiros
tão positivos no Brasil mesmo em meio a desaceleração econômica? E se o seu
negócio principal é emprestar dinheiro não seria natural esperar resultados
menos robustos em tempos de retração do crédito?
Analistas e entidades ligadas ao setor explicam essa
resiliência com fatores de duas ordens.
De um lado, há os que enfatizam a solidez do sistema
financeiro brasileiro, os ganhos de eficiência e avanços tecnológicos
promovidos pelas empresas.
Uma das explicações para o lucro do Itaú, por exemplo, é que
o banco teria conseguido melhorar a qualidade de sua carteira, cortando custos
com inadimplência.
Itaú registrou maior lucro da história dos bancos brasileiro
de capital aberto
Os avanços tecnológicos também estariam tornando as empresas
mais competitivas e ajudando a reduzir despesas.
"É uma boa notícia que os bancos estejam apresentando
bons resultados e demonstrem solidez em tempos de estagnação econômica, porque
ninguém ganha com uma crise bancária", diz Ricardo Rocha, professor do
Insper.
"Problemas no sistema financeiro tendem a agravar
crises econômicas – e, se há contágio, no final todos pagam a conta."
Rocha lembra que nos anos 80 e 90, alguns bancos brasileiros
quebraram ou tiveram de ser socorridos.
"Desde então, avançamos muito na regulação do setor e
houve um movimento de consolidação desse mercado. Além disso, com tantos anos
de instabilidade e inflação as empresas se tornaram mais resistentes,
aprenderam a lidar com adversidades."
Juros altos
De outro lado, porém, há quem tenha uma visão mais crítica,
chamando atenção para a importância de fatores como a alta dos juros e do
spread bancário nesses bons resultados.
"Parte dos retornos dos bancos é garantida com
aplicações financeiras que não são empréstimos a pessoas físicas ou
empresas", diz o economista e professor da USP, Fernando Rugitsky.
"Se a Selic (taxa de juros básicas da economia) sobe,
como tem acontecido, temos um aumento do piso de rendimento do mercado
financeiro. Em última instância, se os bancos não conseguem emprestar seus
recursos, podem aplicá-los em títulos do tesouro. Então quanto maior os juros
pagos por esses títulos, mais os bancos ganham nesse tipo de operação."
Einar Rivero, da Economatica, diz que a diferença da taxa de
juros básica de cada economia de fato ajuda a explicar a distância entre a
rentabilidade de bancos americanos e brasileiros.
"No Brasil, as operações de curto prazo podem ser
rentáveis e ao mesmo tempo ter uma liquidez elevada – e isso não ocorre em
muitas partes do mundo", diz o economista Luiz Fernando de Paula, da Uerj.
Rocha, porém, diz que é mito dizer que os bancos sempre
lucram com os juros altos. "Depende da situação, já que, por outro lado, a
alta dos juros também tende a aumentar a inadimplência", opina.
Spreads
Segundo os bancos, o ambiente de negócios no Brasil - com
altos impostos e risco de inadimplência relativamente elevado – é o que faz com
que o spread bancário tenha de ser maior que o de outros países.
O spread, simplificando, é a diferença entre o que banco
cobra para emprestar recursos e o que paga para tomá-los emprestado. É dele que
a empresa tira o lucro, depois de pagar os impostos e cobrir os custos
administrativos e ligados ao risco de inadimplência.
"Aqui não é raro o Judiciário entravar a execução de
uma garantia pelo banco, por exemplo, o que faz com que o risco de fazer um
empréstimo e não receber seja maior", exemplifica Rocha.
De Paula, porém, diz que o fato de esse mercado ser
relativamente concentrado no Brasil também impulsiona as taxas cobradas pelos
empréstimos.
Bancários afirmam que, apesar de lucros, houve demissões no
setor
"Os bancos procuram se precaver dos efeitos negativos
da desaceleração da economia aumentando o spread bancário", diz o
economista.
"O crédito não é como um produto de supermercado que o
cliente escolhe na hora. São poucos bancos e há um índice de fidelização
elevada – então não há muita resistência a elevação da taxa cobrada dos
empréstimos ou mesmo das tarifas bancárias."
Em 2014, os juros bancários para as operações com pessoas
físicas por exemplo, subiram 5,4 pontos percentuais, em média – três vezes mais
que a alta da Selic no período (1,75 ponto porcentual). Já a taxa de captação
dos bancos para operações desse tipo ficou praticamente estável.
Demissões
Curiosamente, entre as vozes mais críticas aos altos lucros
dos bancos estão representantes de seus funcionários.
Os sindicalistas reclamam, por exemplo, que, apesar dos
ganhos extraordinários, o setor demitiu no ano passado.
"Só a ganância explica isso. Houve um fechamento de 5
mil vagas e cada vez mais há uma sobrecarga de trabalho entre os empregados do
setor porque as empresas querem reduzir suas despesas cortando a folha
salarial", critica Juvandia Moreira, presidente do Sindicato dos Bancários
de São Paulo.
Moreira diz que, em alguns casos, há funcionários
responsáveis por mais de 400 clientes.
Na busca por resultados, segundo a líder sindical, muitos
seriam submetidos a metas abusivas e pressionados a vender para os clientes não
os produtos e aplicações financeiras melhores para eles, mas sim o que dá mais
retorno para o banco.
"Os bancos são uma concessão pública e têm um papel
social. Eles poderiam ter um lucro menor, se preocupando mais com o emprego ou
cobrando juros menores. Não há porque as instituições financeiras brasileiras
ganharem muito mais que as americanas", opina Moreira.
Magnus Ribas Apostólico, diretor de relações do trabalho da
Federação Brasileira de Bancos (Febraban) nega que haja um corte de pessoal
significativo no setor.
Ele diz que nos últimos anos o número de funcionários de
bancos passou de 400 mil para 511 mil "mesmo considerando as mudanças
tecnológicas – entre elas o avanço das operações eletrônicas."
Na sua versão as recentes demissões seriam um "pequeno
ajuste".
"É difícil pensar que os trabalhadores estejam
sobrecarregados", diz Apostólico.
"O setor bancário tem o maior índice de permanência dos
funcionários em uma mesma empresa, depois do setor público. Isso não
aconteceria se não oferecessem boas condições de trabalho e oportunidades de
carreira."
Ruth Costas Da BBC
Brasil em São Paulo
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